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ANAIS DO XIV ENCONTRO NACIONAL DA ABRAPSO - RESUMO
ISSN 1981-4321

Tema: Mesa Redonda - Histórias, Teorias e Metodologias

PESQUISA-INTERVENÇÃO NA PRODUÇÃO DE CONHECIMENTOS

Financiador:
SANDRA D.TOROSSIAN ( )
Autores:
Situamos, nesta mesa, o tema da pesquisa-intervenção em um contexto de onde emerge um movimento de discussão sobre a pesquisa científica em Psicologia. Este movimento pode ser compreendido como uma das decorrências do que se viveu no país nas décadas de 80 e 90, através das demandas que se configuraram a partir de Movimentos com o da Constituinte, da Reforma Psiquiátrica, do SUS (Sistema Único de Saúde), do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), lançando interrogações sobre as técnicas, os métodos e as práticas até então instituídas e que hoje impõem interrogações e reformulações no fazer e na produção de conhecimento psi. A pesquisa- intervenção é aqui apresentada como uma atitude. Assim compreendida, a ciência e, conseqüentemente, a pesquisa deve considerar a experiência não como um mero sistema de dados a serem coletados e analisados, mas antes como acontecimentos que levam à constituição subjetiva. A ciência moderna pretendeu conhecer para melhor dominar o mundo/natureza, afirmando que o conhecimento é legítimo independente das condições em que foi produzido. Deparamo-nos, nesse momento, com uma posição epistemológica da ciência herdeira do Iluminismo, que cria a verdade social amparada no silêncio de seus protagonistas. E, nesta esteira, ocorreu uma grande capacidade de ação científica, com grande volume, sem que se desenvolvesse a mesma capacidade de reflexão a respeito das conseqüências desta. Ou seja, em Psicologia isto pode ser traduzido como a exaltação dos diagnósticos, a relevância da incidência numérica de casos bem como a sua estigmatização. Isto só foi possível por meio da descontextualização do conhecimento, transformando-o em absoluto para uma comunidade de pesquisadores, à medida que se apresenta linear e refratário à problematização política e ética. Hoje reverte-se o quadro ao desconstruir-se as verdades absolutas da ciência e ao revelar-se o interjogo de forças políticas sempre presentes. Como contrapartida a ser apresentada neste debate, propõe-se um percurso epistemológico, na perspectiva da Análise Institucional em que se considera a pesquisa-intervenção como prática de ordem micropolítica. Além disso, trazemos o pensamento o filósofo Jacques Derrida cuja obra é dedicada a desconstruções de hegemonias nos discursos acadêmicos. As desconstruções valorizam aquilo que ficou fora da discussão hegemônica, que foi marginalizado no trabalho acadêmico por uma operação hierarquizante de recalcamento. Num terceiro trabalho propomos a pesquisa-intervenção enquanto atitude do pesquisar, trazendo o diálogo com a psicanálise contemporânea a partir das contribuições de Ricardo Rodulfo. Situamos, nesta mesa, o tema da pesquisa-intervenção em um contexto de onde emerge um movimento de discussão sobre a pesquisa científica em Psicologia. Este movimento pode ser compreendido como uma das decorrências do que se viveu no país nas décadas de 80 e 90, através das demandas que se configuraram a partir de Movimentos com o da Constituinte, da Reforma Psiquiátrica, do SUS (Sistema Único de Saúde), do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), lançando interrogações sobre as técnicas, os métodos e as práticas até então instituídas e que hoje impõem interrogações e reformulações no fazer e na produção de conhecimento psi. A pesquisa- intervenção é aqui apresentada como uma atitude. Assim compreendida, a ciência e, conseqüentemente, a pesquisa deve considerar a experiência não como um mero sistema de dados a serem coletados e analisados, mas antes como acontecimentos que levam à constituição subjetiva. A ciência moderna pretendeu conhecer para melhor dominar o mundo/natureza, afirmando que o conhecimento é legítimo independente das condições em que foi produzido. Deparamo-nos, nesse momento, com uma posição epistemológica da ciência herdeira do Iluminismo, que cria a verdade social amparada no silêncio de seus protagonistas. E, nesta esteira, ocorreu uma grande capacidade de ação científica, com grande volume, sem que se desenvolvesse a mesma capacidade de reflexão a respeito das conseqüências desta. Ou seja, em Psicologia isto pode ser traduzido como a exaltação dos diagnósticos, a relevância da incidência numérica de casos bem como a sua estigmatização. Isto só foi possível por meio da descontextualização do conhecimento, transformando-o em absoluto para uma comunidade de pesquisadores, à medida que se apresenta linear e refratário à problematização política e ética. Hoje reverte-se o quadro ao desconstruir-se as verdades absolutas da ciência e ao revelar-se o interjogo de forças políticas sempre presentes. Como contrapartida a ser apresentada neste debate, propõe-se um percurso epistemológico, na perspectiva da Análise Institucional em que se considera a pesquisa-intervenção como prática de ordem micropolítica. Além disso, trazemos o pensamento o filósofo Jacques Derrida cuja obra é dedicada a desconstruções de hegemonias nos discursos acadêmicos. As desconstruções valorizam aquilo que ficou fora da discussão hegemônica, que foi marginalizado no trabalho acadêmico por uma operação hierarquizante de recalcamento. Num terceiro trabalho propomos a pesquisa-intervenção enquanto atitude do pesquisar, trazendo o diálogo com a psicanálise contemporânea a partir das contribuições de Ricardo Rodulfo.
 
 

Resumo das Falas

SANDRA DJAMBOLAKDJIAN TOROSSIAN(UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS-UNISINOS)

UMA ATITUDE DO PESQUISAR:PSICANÁLISE E PESQUISA-INTERVENÇÃO

A pesquisa apresentada como uma atitude marca uma mudança conceitual e paradigmática em relação à lógica de pesquisa encontrada no projeto epistemológico da ciência moderna, denominado por Foucault como analítica da verdade. Segundo Barros e Lucero (2005) esse autor destaca ainda uma outra linha filosófica que surge na modernidade: a ontologia do presente. Foucault (2000) propõe a ontologia crítica como uma atitude ou um ethos na qual a crítica é situada a partir da análise histórica dos limites e a prova de sua ultrapassagem. Assim compreendida, a ciência e, conseqüentemente, a pesquisa deve considerar a experiência não como um mero sistema de dados a serem coletados e analisados, mas antes como acontecimentos que levam à constituição subjetiva. Um dos paradigmas contemporâneos que dão conta dessa atitude do pesquisar é a pesquisa-intervenção. Esse paradigma sustenta-se na desconstrução das oposições sujeito-pesquisador X objeto pesquisado, compreendendo que o processo de investigação é produtor de subjetividades. Por isso, considera-se que a intervenção produz subjetividades-conhecimentos. Neste texto, objetivamos realizar um primeiro momento de aproximação entre as atitudes do pesquisar emergentes da psicanálise contemporânea e a pesquisa-intervenção. Essa aproximação é justificada uma vez que a Psicanálise é um dos campos de problematização da racionalidade moderna (Birman, 1996). No entanto, deve ser realizada de forma cuidadosa e desapressadamente para não entrarmos em rápidas conclusões opositoras. Em conformidade com a necessidade de uma atitude cuidadosa de aproximação entre as mencionadas atitudes do pesquisar, escolhemos estabelecer o diálogo a partir das contribuições de Ricardo Rodulfo, psicanalista argentino contemporâneo. Essa escolha sustenta-se na descontsrução, empreendida pelo autor, da psicanálise por ele denominada "tradicional". Faz isso, a partir do desafio proposto por Jacques Derrida de descontruir os textos psicanalíticos, desfazendo-os a partir do modo como estes foram organizados originalmente. Rodulfo, então, aceita as críticas realizadas pelo movimento "pós-estruturalista", não para tornar-se "anti" psicanalítico, mas para fazer trabalhar os conceitos psicanalíticos a partir da experiência clínica. Experiência essa tomada, como mencionamos anteriormente, enquanto processo de subjetivação. O movimento "pós- estruturalista" dirige à psicanálise, críticas que aqui resumiremos nos seguintes pontos: 1) a proposta psicanalítica de uma essência subjetiva na qual o inconsciente toma um lugar central; 2) o pressuposto de universalidade presente em muitas das conceituações psicanalíticas e 3) uma noção de certa permanência estrutural do sujeito e da psicopatologia. Numa atitude de pesquisa que incorpore esses assinalamentos e os transporte para o campo psicanalítico devemos considerar o descentramento proposto pela Psicanálise em relação à racionalidade moderna na explicação do humano, bem como a indissociação entre pesquisa e intervenção clínica. Essa é a proposta que vigora desde Freud. No entanto, raros são os autores que, depois de Freud, problematizam a pesquisa psicanalítica a partir das contribuições do pensamento contemporâneo. Em virtude de sermos favoráveis à inclusão dos modos de pensar propostos na contemporaneidade, especialmente a partir da física quântica e do olhar para a complexidade, no corpo da Psicanálise, estaremos apoiando-nos neste diálogo nas proposições de Ricardo Rodulfo (2004). Estaremos considerando as contribuições da psicanálise "tradicional" numa relação de suplementariedade com as contribuições "pós-modernas" ou "pós-estruturais". Mencionar a "suplementariedade" implica em não abandonar nem o conceito de estrutura, nem a história, mas trabalhar entre essas noções. Ao mencionar a descontrução, Derrida não propõe a destruição das idéias que o antecederam, mas a leitura dessas idéias a partir do trabalho descontrutivo do seu texto. Atravessado por Derrida, Rodulfo mantém essa atitude em relação à clínica psicanalítica. Assim, Rodulfo propõe o estudo clínico como gênero de pesquisa. Esse gênero consiste numa maneira de contar, de narrar a clínica, com refluxos raramente lineares que tem na sinuosidade sua atitude prioritária. No estudo clínico evita-se o pingue-pongue de perguntas e respostas dando ênfase ao processamento dos materiais. Um processamento não assimilável à aplicação de um molde sobre uma massa, mas ao processo do amassar do qual irá surgindo a conceitualização. A leitura da Psicanálise realizada por esse autor reside, então, na problematização das oposições binárias. Assim, seguindo a proposta freudiana de colocar as situações clínicas em análise, pode trabalhar os conceitos na perspectiva de trabalho entre as oposições. Uma das desconstruções realizadas pelo autor faz emergir o Logocentrismo que habita, ainda, os textos psicanalíticos, bem como as leituras, muitas vezes dogmáticas, desses textos. A psicanálise freudiana, ao sublinhar a subjetividade, rompe com o pensamento moderno que coloca a racionalidade como centro ou núcleo do humano. No entanto, a concepção de núcleo permanece. Onde antes estava a razão, Freud situa o inconsciente. Ainda depois de Freud autores como Lacan e Winnicott mantém a noção de "centro" no que se refere ao inconsciente: para Lacan a lingüística ocupa esse lugar e Winnicott centra-se na relação. Ao problematizar o conceito de núcleo, Derrida propõe a difusão. Coerente com essa proposta, Rodulfo sustenta que a Psicanálise possa pensar o "novo" o "acontecimento" liberando-se do modelo da física mecânica, tomado como eixo por Freud, e aderindo ao modelo da física quântica. Da mesma forma, o autor salienta que a Psicanálise deve liberar-se do falocentrismo e considerar os novos fenômenos de escritura (mídia, virtualidade) que geram novas subjetividades e conhecimento, ou subjetividade-conhecimento. Para sustentar a continuidade entre a noção de subjetividade e conhecimento recorremos a Maraschin (2004) a qual salienta que toda pesquisa é uma intervenção. A pesquisa, então, torna-se potência instituinte na medida em que possibilita a desestabilização de modos de ação recorrentes. Colocando no mesmo ato conhecimento, intervenção e autoria, a ação de pesquisar cria territórios de conhecimento e subjetivação. O trabalho aqui apresentado focaliza o processo de "amassado", conceitualização e, portanto, da produção de conhecimentos. Fazemos isso concebendo a pesquisa psicanalítica e a pesquisa-intervenção como atitudes do pesquisar e não somente como mais uma metodologia de pesquisa qualitativa. Para a compreensão dessa atitude recorremos ao dispositivo. O conceito de dispositivo pode ser aproximado aqui à concepção foucaultiana de "disparador". Assim, a pesquisa é concebida como disparadora de ações e processos que colocam em questão formas estabilizadas de conhecimento. Tomando uma via diferente da lógica científica herdada da racionalidade moderna essa atitude não busca dados estáticos, mas processos em movimento. Na construção deste paradigma algumas idéias naturalizadas precisam ser problematizadas, uma delas é a concepção de mundo e de sujeito como algo "dado", estabilizado e permanente. A pesquisa apresentada como uma atitude marca uma mudança conceitual e paradigmática em relação à lógica de pesquisa encontrada no projeto epistemológico da ciência moderna, denominado por Foucault como analítica da verdade. Segundo Barros e Lucero (2005) esse autor destaca ainda uma outra linha filosófica que surge na modernidade: a ontologia do presente. Foucault (2000) propõe a ontologia crítica como uma atitude ou um ethos na qual a crítica é situada a partir da análise histórica dos limites e a prova de sua ultrapassagem. Assim compreendida, a ciência e, conseqüentemente, a pesquisa deve considerar a experiência não como um mero sistema de dados a serem coletados e analisados, mas antes como acontecimentos que levam à constituição subjetiva. Um dos paradigmas contemporâneos que dão conta dessa atitude do pesquisar é a pesquisa-intervenção. Esse paradigma sustenta-se na desconstrução das oposições sujeito-pesquisador X objeto pesquisado, compreendendo que o processo de investigação é produtor de subjetividades. Por isso, considera-se que a intervenção produz subjetividades-conhecimentos. Neste texto, objetivamos realizar um primeiro momento de aproximação entre as atitudes do pesquisar emergentes da psicanálise contemporânea e a pesquisa-intervenção. Essa aproximação é justificada uma vez que a Psicanálise é um dos campos de problematização da racionalidade moderna (Birman, 1996). No entanto, deve ser realizada de forma cuidadosa e desapressadamente para não entrarmos em rápidas conclusões opositoras. Em conformidade com a necessidade de uma atitude cuidadosa de aproximação entre as mencionadas atitudes do pesquisar, escolhemos estabelecer o diálogo a partir das contribuições de Ricardo Rodulfo, psicanalista argentino contemporâneo. Essa escolha sustenta-se na descontsrução, empreendida pelo autor, da psicanálise por ele denominada "tradicional". Faz isso, a partir do desafio proposto por Jacques Derrida de descontruir os textos psicanalíticos, desfazendo-os a partir do modo como estes foram organizados originalmente. Rodulfo, então, aceita as críticas realizadas pelo movimento "pós-estruturalista", não para tornar-se "anti" psicanalítico, mas para fazer trabalhar os conceitos psicanalíticos a partir da experiência clínica. Experiência essa tomada, como mencionamos anteriormente, enquanto processo de subjetivação. O movimento "pós- estruturalista" dirige à psicanálise, críticas que aqui resumiremos nos seguintes pontos: 1) a proposta psicanalítica de uma essência subjetiva na qual o inconsciente toma um lugar central; 2) o pressuposto de universalidade presente em muitas das conceituações psicanalíticas e 3) uma noção de certa permanência estrutural do sujeito e da psicopatologia. Numa atitude de pesquisa que incorpore esses assinalamentos e os transporte para o campo psicanalítico devemos considerar o descentramento proposto pela Psicanálise em relação à racionalidade moderna na explicação do humano, bem como a indissociação entre pesquisa e intervenção clínica. Essa é a proposta que vigora desde Freud. No entanto, raros são os autores que, depois de Freud, problematizam a pesquisa psicanalítica a partir das contribuições do pensamento contemporâneo. Em virtude de sermos favoráveis à inclusão dos modos de pensar propostos na contemporaneidade, especialmente a partir da física quântica e do olhar para a complexidade, no corpo da Psicanálise, estaremos apoiando-nos neste diálogo nas proposições de Ricardo Rodulfo (2004). Estaremos considerando as contribuições da psicanálise "tradicional" numa relação de suplementariedade com as contribuições "pós-modernas" ou "pós-estruturais". Mencionar a "suplementariedade" implica em não abandonar nem o conceito de estrutura, nem a história, mas trabalhar entre essas noções. Ao mencionar a descontrução, Derrida não propõe a destruição das idéias que o antecederam, mas a leitura dessas idéias a partir do trabalho descontrutivo do seu texto. Atravessado por Derrida, Rodulfo mantém essa atitude em relação à clínica psicanalítica. Assim, Rodulfo propõe o estudo clínico como gênero de pesquisa. Esse gênero consiste numa maneira de contar, de narrar a clínica, com refluxos raramente lineares que tem na sinuosidade sua atitude prioritária. No estudo clínico evita-se o pingue-pongue de perguntas e respostas dando ênfase ao processamento dos materiais. Um processamento não assimilável à aplicação de um molde sobre uma massa, mas ao processo do amassar do qual irá surgindo a conceitualização. A leitura da Psicanálise realizada por esse autor reside, então, na problematização das oposições binárias. Assim, seguindo a proposta freudiana de colocar as situações clínicas em análise, pode trabalhar os conceitos na perspectiva de trabalho entre as oposições. Uma das desconstruções realizadas pelo autor faz emergir o Logocentrismo que habita, ainda, os textos psicanalíticos, bem como as leituras, muitas vezes dogmáticas, desses textos. A psicanálise freudiana, ao sublinhar a subjetividade, rompe com o pensamento moderno que coloca a racionalidade como centro ou núcleo do humano. No entanto, a concepção de núcleo permanece. Onde antes estava a razão, Freud situa o inconsciente. Ainda depois de Freud autores como Lacan e Winnicott mantém a noção de "centro" no que se refere ao inconsciente: para Lacan a lingüística ocupa esse lugar e Winnicott centra-se na relação. Ao problematizar o conceito de núcleo, Derrida propõe a difusão. Coerente com essa proposta, Rodulfo sustenta que a Psicanálise possa pensar o "novo" o "acontecimento" liberando-se do modelo da física mecânica, tomado como eixo por Freud, e aderindo ao modelo da física quântica. Da mesma forma, o autor salienta que a Psicanálise deve liberar-se do falocentrismo e considerar os novos fenômenos de escritura (mídia, virtualidade) que geram novas subjetividades e conhecimento, ou subjetividade-conhecimento. Para sustentar a continuidade entre a noção de subjetividade e conhecimento recorremos a Maraschin (2004) a qual salienta que toda pesquisa é uma intervenção. A pesquisa, então, torna-se potência instituinte na medida em que possibilita a desestabilização de modos de ação recorrentes. Colocando no mesmo ato conhecimento, intervenção e autoria, a ação de pesquisar cria territórios de conhecimento e subjetivação. O trabalho aqui apresentado focaliza o processo de "amassado", conceitualização e, portanto, da produção de conhecimentos. Fazemos isso concebendo a pesquisa psicanalítica e a pesquisa-intervenção como atitudes do pesquisar e não somente como mais uma metodologia de pesquisa qualitativa. Para a compreensão dessa atitude recorremos ao dispositivo. O conceito de dispositivo pode ser aproximado aqui à concepção foucaultiana de "disparador". Assim, a pesquisa é concebida como disparadora de ações e processos que colocam em questão formas estabilizadas de conhecimento. Tomando uma via diferente da lógica científica herdada da racionalidade moderna essa atitude não busca dados estáticos, mas processos em movimento. Na construção deste paradigma algumas idéias naturalizadas precisam ser problematizadas, uma delas é a concepção de mundo e de sujeito como algo "dado", estabilizado e permanente.

ROSEMARIE GARTNER TSCHIEDEL (UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS-UNISINOS)

A PESQUISA-INTERVENÇÃO E A RESTITUIÇÕA NA CONTRUÇÃO DE CONHECIMENTO

Situamos o tema da pesquisa-intervenção em um contexto de onde emerge um movimento de discussão sobre a pesquisa científica em Psicologia. Este movimento pode ser compreendido como uma das decorrências do que se viveu no país nas décadas de 80 e 90, através das demandas que se configuraram a partir de Movimentos com o da Constituinte, da Reforma Psiquiátrica, do SUS (Sistema Único de Saúde), do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), lançando interrogações sobre as técnicas, os métodos e as práticas até então instituídas e que hoje impõem interrogações e reformulações no fazer e na produção de conhecimento psi. Como destaca Santos (2002), a ciência moderna pretendeu conhecer para melhor dominar o mundo/natureza, afirmando que o conhecimento é legítimo independente das condições em que foi produzido. Deparamo-nos, nesse momento, com uma posição epistemológica da ciência herdeira do Iluminismo, que cria a verdade social amparada no silêncio de seus protagonistas. E, nesta esteira, ocorreu uma grande capacidade de ação científica, com grande volume, sem que se desenvolvesse a mesma capacidade de reflexão a respeito das conseqüências desta. Ou seja, em Psicologia isto pode ser traduzido como a exaltação dos diagnósticos, a relevância da incidência numérica de casos bem como a sua estigmatização. Isto só foi possível por meio da descontextualização do conhecimento, transformando-o em absoluto para uma comunidade de pesquisadores, à medida que se apresenta linear e refratário à problematização política e ética. Hoje reverte-se o quadro ao desconstruir-se as verdades absolutas da ciência e ao revelar-se o interjogo de forças políticas sempre presentes. Como contrapartida a ser apresentada neste debate, propõe-se um percurso epistemológico, na perspectiva da Análise Institucional em que se considera a pesquisa-intervenção como prática de ordem micropolítica, como também referem Rocha e Aguiar (2003), ao radicalizar a interferência que se produz no encontro entre participantes pesquisadores e não pesquisadores. O que se produz? Como se produz conhecimento neste contexto atravessado por diferentes lógicas e, a quem pertence o que se produz? As relações sociais estão organizadas tanto por regras e códigos visíveis, como por uma faceta encoberta e velada. Deste modo, na vertente socioanalítica da Análise Institucional, tomamos o conceito de analisador para visualizar os lugares de exercício da palavra propiciando o explicitar daquilo que até então, está oculto. Conforme Lourau (2004) a palavra social é censurada, pois ela indica a vontade de transformação. Sendo assim, todo conhecimento que é generalizado e universalizado, toda pesquisa que não se pergunta em que condições ela ocorre, e como vivem seus protagonistas, abrevia as singularidades locais silenciando os pontos de vista de uma determinada comunidade. No Brasil temos o exemplo da discussão sobre a redução da maioridade penal enquanto se constata que, nas duas últimas décadas, houve um aumento de 306% de homicídios notificados de jovens de até 19 anos conforme o SIM-MS (Sistema de Informações sobre Mortalidade do Ministério da Saúde), colocando o país em primeiro lugar na vitimização de seus jovens. Isto nos aproxima do entendimento de uma hegemonia que tem como principal alicerce o descaso com a reflexão de seus processos, amortecendo os próprios dados como possíveis analisadores do que se passa com a infância e juventude do nosso país. Já o movimento instituinte, ativado na micropolítica, refere-se aos espaços da intervenção que gerem um conhecimento produzido coletivamente através das possibilidades de reinterpretação da e na própria comunidade. Neste sentido, produzem-se modos de subjetivação pelos quais os indivíduos e as coletividades se constituem como sujeitos, principalmente quando resistem e escapam dos poderes e saberes instituídos. Ao fazermos esta consideração, insistimos na possibilidade de análise destes processos opondo-se às regras que legitimam a repressão e o desconhecimento, isto é, as regras que historicamente instituíram e naturalizaram o desconhecimento. De acordo com Maraschin (2004), o método se constitui uma intervenção quando favorece novas conexões e a possibilidade de re-significar explicações anteriores. Assim, na pesquisa-intervenção o pesquisador compõe novos olhares, através das alterações produzidas em si mesmo, e pela linguagem do material, nesta análise de implicação trilham-se caminhos para oferecer diferentes sentidos em relação ao cristalizado. A apropriação destes sentidos é a descoberta da transversalidade que emerge da tensão entre o pronunciável e o não pronunciável. Quando um grupo ou coletivo não reconhece tais atravessamentos, tende a reproduzir aquilo que está instituído, portanto, o processo de transversalização é o seu reconhecimento. Como dispositivo analítico, dirigimo-nos ao conceito de restituição, que não se refere a oferecer simplesmente devoluções ou informações, mas abrir vias de acesso que tornem possíveis a reflexão para os participantes, o contato com os materiais e o retorno a acontecimentos de seu entorno, que costumam ficar esquecidos ou silenciados. Este explicitar é uma forma de gerar associações que podem provocar risos, estranhamento e repreensão. Para Lourau (1993) a população estudada que trabalha esta restituição, pode se apropriar de uma parcela do saber do pesquisador, que igualmente lhe pertence, tornando-se de algum modo um 'pesquisador coletivo' que repassa novas restituições. O lugar socializador da pesquisa se consolida, para o autor, neste movimento que requer co-gestão e co-participação. Podemos considerar que, desta forma, se construiu uma nova postura epistemológica pois, a simples ação que não indagava sobre suas as conseqüências, como antes mencionado, torna-se na pesquisa-intervenção uma nova condição: a explicitação do processo de conhecimento. A restituição como técnica, neste caso, é propulsora da auto-análise; em geral, as populações não se apropriam do direito à restituição, o que lhes poderia trazer ampliação em seu processo de apropriação. Um projeto de sociedade democrática deve prever tais movimentos de circulação do poder-saber, que prescindem de olhares - e fazeres - micro, para que sejam contempladas as especificidades culturais, econômicas, históricas: os diferentes modos de subjetivação. Tais considerações encaminham para o conceito de implicação, o observador sempre está implicado em seu campo de observação. Mais do que levar em conta, será necessário tomar estes elementos que sua intenção e presença produzem, para a reflexão; por isso, falamos em análise da implicação, que exige decifrar o saber que é conscientemente dissimulado, e o não saber que inconscientemente é parte de nossas relações. Lourau (2004), ao indicar que o sistema de referência da análise institucional é o conjunto das instituições, acentua que a transversalidade poderá ser o meio de recuperar os conhecimentos referentes ao próprio meio em que se vive. Neste itinerário, a análise institucional propõe a fusão dos saberes locais, não legitimados pelo discurso unificado das ciências, aos saberes considerados eruditos, qualificados e hierarquicamente dispostos. Entende-se que os sujeitos falam da perspectiva em que se encontram, em determinado lugar de suas redes de relações, oferecendo uma ordem simbólica destas. Outra parcela dos conteúdos históricos fica submersa pelo discurso formalmente sistematizado, instituído, sem que apareçam as lutas e a memória dos enfrentamentos instituintes, ocorridos ao longo da história. Quando no pesquisar são mapeadas as condições de produção de subjetividades junto àqueles que protagonizam a sua história assume-se uma epistemologia emancipatória (Santos, 2002). Neste movimento, o pesquisador reivindicará o espaço livre para a palavra e o gesto colocando-se a pesquisa em permanente análise como instituição de produção de conhecimento constituída de forças considerando-se que a pesquisa intervenção configura-se quando os efeitos do processo de restituição gerarem práticas de co-responsabilidade e os participantes - pesquisadores coletivos - reassegurarem o espaço da liberdade. Situamos o tema da pesquisa-intervenção em um contexto de onde emerge um movimento de discussão sobre a pesquisa científica em Psicologia. Este movimento pode ser compreendido como uma das decorrências do que se viveu no país nas décadas de 80 e 90, através das demandas que se configuraram a partir de Movimentos com o da Constituinte, da Reforma Psiquiátrica, do SUS (Sistema Único de Saúde), do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), lançando interrogações sobre as técnicas, os métodos e as práticas até então instituídas e que hoje impõem interrogações e reformulações no fazer e na produção de conhecimento psi. Como destaca Santos (2002), a ciência moderna pretendeu conhecer para melhor dominar o mundo/natureza, afirmando que o conhecimento é legítimo independente das condições em que foi produzido. Deparamo-nos, nesse momento, com uma posição epistemológica da ciência herdeira do Iluminismo, que cria a verdade social amparada no silêncio de seus protagonistas. E, nesta esteira, ocorreu uma grande capacidade de ação científica, com grande volume, sem que se desenvolvesse a mesma capacidade de reflexão a respeito das conseqüências desta. Ou seja, em Psicologia isto pode ser traduzido como a exaltação dos diagnósticos, a relevância da incidência numérica de casos bem como a sua estigmatização. Isto só foi possível por meio da descontextualização do conhecimento, transformando-o em absoluto para uma comunidade de pesquisadores, à medida que se apresenta linear e refratário à problematização política e ética. Hoje reverte-se o quadro ao desconstruir-se as verdades absolutas da ciência e ao revelar-se o interjogo de forças políticas sempre presentes. Como contrapartida a ser apresentada neste debate, propõe-se um percurso epistemológico, na perspectiva da Análise Institucional em que se considera a pesquisa-intervenção como prática de ordem micropolítica, como também referem Rocha e Aguiar (2003), ao radicalizar a interferência que se produz no encontro entre participantes pesquisadores e não pesquisadores. O que se produz? Como se produz conhecimento neste contexto atravessado por diferentes lógicas e, a quem pertence o que se produz? As relações sociais estão organizadas tanto por regras e códigos visíveis, como por uma faceta encoberta e velada. Deste modo, na vertente socioanalítica da Análise Institucional, tomamos o conceito de analisador para visualizar os lugares de exercício da palavra propiciando o explicitar daquilo que até então, está oculto. Conforme Lourau (2004) a palavra social é censurada, pois ela indica a vontade de transformação. Sendo assim, todo conhecimento que é generalizado e universalizado, toda pesquisa que não se pergunta em que condições ela ocorre, e como vivem seus protagonistas, abrevia as singularidades locais silenciando os pontos de vista de uma determinada comunidade. No Brasil temos o exemplo da discussão sobre a redução da maioridade penal enquanto se constata que, nas duas últimas décadas, houve um aumento de 306% de homicídios notificados de jovens de até 19 anos conforme o SIM-MS (Sistema de Informações sobre Mortalidade do Ministério da Saúde), colocando o país em primeiro lugar na vitimização de seus jovens. Isto nos aproxima do entendimento de uma hegemonia que tem como principal alicerce o descaso com a reflexão de seus processos, amortecendo os próprios dados como possíveis analisadores do que se passa com a infância e juventude do nosso país. Já o movimento instituinte, ativado na micropolítica, refere-se aos espaços da intervenção que gerem um conhecimento produzido coletivamente através das possibilidades de reinterpretação da e na própria comunidade. Neste sentido, produzem-se modos de subjetivação pelos quais os indivíduos e as coletividades se constituem como sujeitos, principalmente quando resistem e escapam dos poderes e saberes instituídos. Ao fazermos esta consideração, insistimos na possibilidade de análise destes processos opondo-se às regras que legitimam a repressão e o desconhecimento, isto é, as regras que historicamente instituíram e naturalizaram o desconhecimento. De acordo com Maraschin (2004), o método se constitui uma intervenção quando favorece novas conexões e a possibilidade de re-significar explicações anteriores. Assim, na pesquisa-intervenção o pesquisador compõe novos olhares, através das alterações produzidas em si mesmo, e pela linguagem do material, nesta análise de implicação trilham-se caminhos para oferecer diferentes sentidos em relação ao cristalizado. A apropriação destes sentidos é a descoberta da transversalidade que emerge da tensão entre o pronunciável e o não pronunciável. Quando um grupo ou coletivo não reconhece tais atravessamentos, tende a reproduzir aquilo que está instituído, portanto, o processo de transversalização é o seu reconhecimento. Como dispositivo analítico, dirigimo-nos ao conceito de restituição, que não se refere a oferecer simplesmente devoluções ou informações, mas abrir vias de acesso que tornem possíveis a reflexão para os participantes, o contato com os materiais e o retorno a acontecimentos de seu entorno, que costumam ficar esquecidos ou silenciados. Este explicitar é uma forma de gerar associações que podem provocar risos, estranhamento e repreensão. Para Lourau (1993) a população estudada que trabalha esta restituição, pode se apropriar de uma parcela do saber do pesquisador, que igualmente lhe pertence, tornando-se de algum modo um 'pesquisador coletivo' que repassa novas restituições. O lugar socializador da pesquisa se consolida, para o autor, neste movimento que requer co-gestão e co-participação. Podemos considerar que, desta forma, se construiu uma nova postura epistemológica pois, a simples ação que não indagava sobre suas as conseqüências, como antes mencionado, torna-se na pesquisa-intervenção uma nova condição: a explicitação do processo de conhecimento. A restituição como técnica, neste caso, é propulsora da auto-análise; em geral, as populações não se apropriam do direito à restituição, o que lhes poderia trazer ampliação em seu processo de apropriação. Um projeto de sociedade democrática deve prever tais movimentos de circulação do poder-saber, que prescindem de olhares - e fazeres - micro, para que sejam contempladas as especificidades culturais, econômicas, históricas: os diferentes modos de subjetivação. Tais considerações encaminham para o conceito de implicação, o observador sempre está implicado em seu campo de observação. Mais do que levar em conta, será necessário tomar estes elementos que sua intenção e presença produzem, para a reflexão; por isso, falamos em análise da implicação, que exige decifrar o saber que é conscientemente dissimulado, e o não saber que inconscientemente é parte de nossas relações. Lourau (2004), ao indicar que o sistema de referência da análise institucional é o conjunto das instituições, acentua que a transversalidade poderá ser o meio de recuperar os conhecimentos referentes ao próprio meio em que se vive. Neste itinerário, a análise institucional propõe a fusão dos saberes locais, não legitimados pelo discurso unificado das ciências, aos saberes considerados eruditos, qualificados e hierarquicamente dispostos. Entende-se que os sujeitos falam da perspectiva em que se encontram, em determinado lugar de suas redes de relações, oferecendo uma ordem simbólica destas. Outra parcela dos conteúdos históricos fica submersa pelo discurso formalmente sistematizado, instituído, sem que apareçam as lutas e a memória dos enfrentamentos instituintes, ocorridos ao longo da história. Quando no pesquisar são mapeadas as condições de produção de subjetividades junto àqueles que protagonizam a sua história assume-se uma epistemologia emancipatória (Santos, 2002). Neste movimento, o pesquisador reivindicará o espaço livre para a palavra e o gesto colocando-se a pesquisa em permanente análise como instituição de produção de conhecimento constituída de forças considerando-se que a pesquisa intervenção configura-se quando os efeitos do processo de restituição gerarem práticas de co-responsabilidade e os participantes - pesquisadores coletivos - reassegurarem o espaço da liberdade.

ANA MARIA MATOS RODRIGUES (UNIVERSIDADE REGIONAL DA BAHIA-UNIRB)

DESCONSTRUÇÕES NA PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL E PSICOLOGIA

Fruto de discussões e problematizações sobre a formação dos psicólogos, nas matrizes curriculares dos cursos de Psicologia foram inseridas disciplinas que visam subsidiar os alunos quanto à contextualização da pesquisa psicológica. Disciplinas tais como: Fundamentos epistemológicos e históricos da psicologia, Ciência e profissão, Pesquisa em psicologia, História da psicologia oportunizam a discussão tanto do ponto de vista histórico quanto epistemológico da produção de conhecimento, bem como da diversidade de propostas existentes em relação a esses mesmos conhecimentos no campo da Psicologia. Em termos epistemológicos, costuma-se identificar duas grandes tendências, ou paradigmas a que estão submetidas as pesquisas cientificas em Psicologia.Tais tendências são apresentadas muitas vezes como um par de oposições: uma tendência se caracterizaria por envolver escolas e propostas mais cientificistas, com aproximação e intercâmbio maior com as ciências biológicas, enquanto outra tendência envolveria escolas mais próximas das ciências sociais e da filosofia com menor ênfase quanto à cientificidade de seus postulados. Há facilidades didáticas inegáveis na abordagem das discussões epistemológicas por esta via que privilegia a dicotomização de tendências em pesquisa psicológica, já que o estudo de Epistemologia é praticamente inexistente na maior parte do ensino médio em nosso país. Alunos e professores têm facilitadas suas tarefas de apreender os conteúdos que envolvem essas disciplinas dos primeiros semestres da graduação. No entanto, não é apenas por facilidades didáticas que se adota um trabalho de dicotomização na abordagem de tais temas. Se nos discursos acadêmicos proliferam discussões onde o pensamento por oposição é hegemônico, há que se registrar que tal hegemonia deve-se principalmente por tratar-se de um discurso condizente com seu pertencimento a toda uma tradição de produção de conhecimento. Tradição que se apresenta estrutural e historicamente insuperável. Não se pode simplesmente pensar, discutir ou pesquisar para mais além ou aquém de uma certa tradição ocidental do que se passou a designar como ciência, numa pretensa superação de dificuldades que são inerentes ao próprio surgimento de termos tais como ciência, científico, acadêmico, epistemológico. Entre os autores que se dedicaram à discussão, ao mesmo tempo, rigorosa e detalhada do pensamento por oposições metafísicas encontra-se o filósofo Jacques Derrida. Sua obra é dedicada a desconstruções de hegemonias nos discursos acadêmicos. Pouco discutida ainda em disciplinas como as mencionadas anteriormente, as desconstruções derridianas podem constituir-se em ferramentas importantes para as problematizações necessárias às pesquisas realizadas em Psicologia. Textos escritos pelo filósofo tais como Gramatologia, Mal de arquivo, Espectros de Marx e tantos outros demonstram o quanto conceitos, teorias, obras sofrem um procedimento de leitura que acabam por encerra-los (devendo-se entender aqui as várias significações que se podem atribuir ao verbo encerrar) num fechamento que os empobrece. Leituras acadêmicas e canônicas tanto empreendidas por seus seguidores quanto por seus críticos. Para a discussão da pesquisa em Psicologia entendida como produção de conhecimentos as desconstruções derridianas auxiliam a pensar na desconstrução da oposição entre as tendências de pesquisa em Psicologia. Esta oposição se desdobra em outras. Seja as que dizem respeito às metodologias de pesquisa, sejam as ditas questões éticas ou até mesmo as mercadológicas (distribuição de bolsas, critérios de publicação de trabalhos, constituição de linhas de pesquisa, bem como seu financiamento) precisam ser trabalhadas com a complexidade que merecem. Um pensamento por oposição, ainda que não seja de todo superável, não tem sido suficiente para enfrentar o fechamento e empobrecimento que por vezes encontramos na abordagem das pesquisas em Psicologia. As desconstruções são o envolvimento num trabalho de tradução disseminante, não de uma língua à outra, embora, muitas vezes, também esta esteja implicada. Tradução da língua dos conceitos, para outros tomados numa cadeia. Cada elemento fazendo rever o anterior. Uma cadeia em que conceito algum ocupa o lugar de regente. Tal trabalho de leitura é ao mesmo tempo um trabalho de escrita que não prescreve uma leitura inevitável. O que não quer dizer que seja permitido ler qualquer coisa. Ler envolve constrangimento e prescrição de uma certa liberdade. As desconstruções valorizam aquilo que ficou fora da discussão hegemônica, que foi marginalizado no trabalho acadêmico por uma operação hierarquizante de recalcamento. Algumas advertências são necessárias. 1. As desconstruções não são um método, nem uma operação, porque não podem ser reduzidas a alguma instrumentalidade metodológica, ou a algum conjunto de regras transponíveis que estejam em concorrência com outras metodologias de interpretação no meios acadêmicos. 2. Tampouco são análises ou críticas que pudessem ser empreendidas por um sujeito presente a si e que se colocasse acima do seu texto ou pesquisa como se houvesse uma neutralidade possível, numa busca em direção a essências e ou uma possível origem indecomponível. As desconstruções se dão num duplo gesto de leitura e escrita. Um desses gestos é o demonstrar a existência uma violenta hierarquia entre as oposições , em vez de uma coexistência pacífica. Tal hierarquia está a serviço de uma homogeneização de um legado, do recalcamento de forças e do fechamento logocêntrico próprio aos discursos acadêmicos. Porém não se pode permanecer apenas num gesto de inversão da hierarquia, já que isto implicaria na permanência no campo a ser desconstruído. Faz-se necessário um outro gesto. O outro movimento é o de transgressão, que implica o surgimento de conceitos que não se deixem compreender pelo sistema desconstruído. Entretanto são necessários os dois gestos ao mesmo tempo, caso contrário negar-se-ia a heterogeneidade inerente a todo legado, contexto ou sistemas de conceitos. Numa desconstrução, pode-se obter um novo "conceito" que não seja o resultado de uma superação da oposição binária, como ocorreria numa interpretação crítica ou dialética. Este novo "conceito" ou "estrutura" resiste às oposições metafísicas sem constituir um terceiro termo. Se grafei a palavra "conceito" e "estrutura" entre aspas é porque são elementos de uma cadeia ou séria, onde também está inscrita a desconstrução. Estes elementos são chamados por Derrida de indecidíveis. São falsas unidades verbais, que habitam o texto da tradição metafísica, sem submeter-se ao fechamento de suas oposições conceituais. Eles oferecem dificuldades especiais para a tradução não só de um idioma a outro, mas também dentro do próprio idioma. Não podem ser definidos, porque não são nem isso nem aquilo, sendo ao mesmo tempo isso e aquilo. Os indecidíveis possibilitam o questionamento das concepções que consideram um corpus, um legado teórico, uma herança como homogêneos. A contribuição que uma leitura desconstrutiva da oposição entre as tendências epistemológicas, ou de paradigmas de pesquisa em Psicologia nos levaria a perguntar o que fica recalcado pela reiteração dessas oposições. A que tipo de fechamento pode-se estar submetido em Psicologia quando fundamentamos nossos procedimentos de pesquisa a partir da oposição entre tendências mais cientificistas ou menos cientificistas? Há indecidíveis nesses postulados epistemológicos que possam auxiliar na abertura para novas possibilidades de pesquisa em Psicologia? Pode-se aceitar que tudo que podia ser dito já foi dito em termos de produção de conhecimento? O campo está encerrado nos paradigmas postos desde a tradição? Fruto de discussões e problematizações sobre a formação dos psicólogos, nas matrizes curriculares dos cursos de Psicologia foram inseridas disciplinas que visam subsidiar os alunos quanto à contextualização da pesquisa psicológica. Disciplinas tais como: Fundamentos epistemológicos e históricos da psicologia, Ciência e profissão, Pesquisa em psicologia, História da psicologia oportunizam a discussão tanto do ponto de vista histórico quanto epistemológico da produção de conhecimento, bem como da diversidade de propostas existentes em relação a esses mesmos conhecimentos no campo da Psicologia. Em termos epistemológicos, costuma-se identificar duas grandes tendências, ou paradigmas a que estão submetidas as pesquisas cientificas em Psicologia.Tais tendências são apresentadas muitas vezes como um par de oposições: uma tendência se caracterizaria por envolver escolas e propostas mais cientificistas, com aproximação e intercâmbio maior com as ciências biológicas, enquanto outra tendência envolveria escolas mais próximas das ciências sociais e da filosofia com menor ênfase quanto à cientificidade de seus postulados. Há facilidades didáticas inegáveis na abordagem das discussões epistemológicas por esta via que privilegia a dicotomização de tendências em pesquisa psicológica, já que o estudo de Epistemologia é praticamente inexistente na maior parte do ensino médio em nosso país. Alunos e professores têm facilitadas suas tarefas de apreender os conteúdos que envolvem essas disciplinas dos primeiros semestres da graduação. No entanto, não é apenas por facilidades didáticas que se adota um trabalho de dicotomização na abordagem de tais temas. Se nos discursos acadêmicos proliferam discussões onde o pensamento por oposição é hegemônico, há que se registrar que tal hegemonia deve-se principalmente por tratar-se de um discurso condizente com seu pertencimento a toda uma tradição de produção de conhecimento. Tradição que se apresenta estrutural e historicamente insuperável. Não se pode simplesmente pensar, discutir ou pesquisar para mais além ou aquém de uma certa tradição ocidental do que se passou a designar como ciência, numa pretensa superação de dificuldades que são inerentes ao próprio surgimento de termos tais como ciência, científico, acadêmico, epistemológico. Entre os autores que se dedicaram à discussão, ao mesmo tempo, rigorosa e detalhada do pensamento por oposições metafísicas encontra-se o filósofo Jacques Derrida. Sua obra é dedicada a desconstruções de hegemonias nos discursos acadêmicos. Pouco discutida ainda em disciplinas como as mencionadas anteriormente, as desconstruções derridianas podem constituir-se em ferramentas importantes para as problematizações necessárias às pesquisas realizadas em Psicologia. Textos escritos pelo filósofo tais como Gramatologia, Mal de arquivo, Espectros de Marx e tantos outros demonstram o quanto conceitos, teorias, obras sofrem um procedimento de leitura que acabam por encerra-los (devendo-se entender aqui as várias significações que se podem atribuir ao verbo encerrar) num fechamento que os empobrece. Leituras acadêmicas e canônicas tanto empreendidas por seus seguidores quanto por seus críticos. Para a discussão da pesquisa em Psicologia entendida como produção de conhecimentos as desconstruções derridianas auxiliam a pensar na desconstrução da oposição entre as tendências de pesquisa em Psicologia. Esta oposição se desdobra em outras. Seja as que dizem respeito às metodologias de pesquisa, sejam as ditas questões éticas ou até mesmo as mercadológicas (distribuição de bolsas, critérios de publicação de trabalhos, constituição de linhas de pesquisa, bem como seu financiamento) precisam ser trabalhadas com a complexidade que merecem. Um pensamento por oposição, ainda que não seja de todo superável, não tem sido suficiente para enfrentar o fechamento e empobrecimento que por vezes encontramos na abordagem das pesquisas em Psicologia. As desconstruções são o envolvimento num trabalho de tradução disseminante, não de uma língua à outra, embora, muitas vezes, também esta esteja implicada. Tradução da língua dos conceitos, para outros tomados numa cadeia. Cada elemento fazendo rever o anterior. Uma cadeia em que conceito algum ocupa o lugar de regente. Tal trabalho de leitura é ao mesmo tempo um trabalho de escrita que não prescreve uma leitura inevitável. O que não quer dizer que seja permitido ler qualquer coisa. Ler envolve constrangimento e prescrição de uma certa liberdade. As desconstruções valorizam aquilo que ficou fora da discussão hegemônica, que foi marginalizado no trabalho acadêmico por uma operação hierarquizante de recalcamento. Algumas advertências são necessárias. 1. As desconstruções não são um método, nem uma operação, porque não podem ser reduzidas a alguma instrumentalidade metodológica, ou a algum conjunto de regras transponíveis que estejam em concorrência com outras metodologias de interpretação no meios acadêmicos. 2. Tampouco são análises ou críticas que pudessem ser empreendidas por um sujeito presente a si e que se colocasse acima do seu texto ou pesquisa como se houvesse uma neutralidade possível, numa busca em direção a essências e ou uma possível origem indecomponível. As desconstruções se dão num duplo gesto de leitura e escrita. Um desses gestos é o demonstrar a existência uma violenta hierarquia entre as oposições , em vez de uma coexistência pacífica. Tal hierarquia está a serviço de uma homogeneização de um legado, do recalcamento de forças e do fechamento logocêntrico próprio aos discursos acadêmicos. Porém não se pode permanecer apenas num gesto de inversão da hierarquia, já que isto implicaria na permanência no campo a ser desconstruído. Faz-se necessário um outro gesto. O outro movimento é o de transgressão, que implica o surgimento de conceitos que não se deixem compreender pelo sistema desconstruído. Entretanto são necessários os dois gestos ao mesmo tempo, caso contrário negar-se-ia a heterogeneidade inerente a todo legado, contexto ou sistemas de conceitos. Numa desconstrução, pode-se obter um novo "conceito" que não seja o resultado de uma superação da oposição binária, como ocorreria numa interpretação crítica ou dialética. Este novo "conceito" ou "estrutura" resiste às oposições metafísicas sem constituir um terceiro termo. Se grafei a palavra "conceito" e "estrutura" entre aspas é porque são elementos de uma cadeia ou séria, onde também está inscrita a desconstrução. Estes elementos são chamados por Derrida de indecidíveis. São falsas unidades verbais, que habitam o texto da tradição metafísica, sem submeter-se ao fechamento de suas oposições conceituais. Eles oferecem dificuldades especiais para a tradução não só de um idioma a outro, mas também dentro do próprio idioma. Não podem ser definidos, porque não são nem isso nem aquilo, sendo ao mesmo tempo isso e aquilo. Os indecidíveis possibilitam o questionamento das concepções que consideram um corpus, um legado teórico, uma herança como homogêneos. A contribuição que uma leitura desconstrutiva da oposição entre as tendências epistemológicas, ou de paradigmas de pesquisa em Psicologia nos levaria a perguntar o que fica recalcado pela reiteração dessas oposições. A que tipo de fechamento pode-se estar submetido em Psicologia quando fundamentamos nossos procedimentos de pesquisa a partir da oposição entre tendências mais cientificistas ou menos cientificistas? Há indecidíveis nesses postulados epistemológicos que possam auxiliar na abertura para novas possibilidades de pesquisa em Psicologia? Pode-se aceitar que tudo que podia ser dito já foi dito em termos de produção de conhecimento? O campo está encerrado nos paradigmas postos desde a tradição?

   
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